Ele que era peça esquecida na prateleira de afetos veio hoje lhe dizer que sentia saudade...
Saudade de quê afinal?
Das unhas vermelhas?
Da calcinha de algodão?
Do seio aflito?
Dos gemidos lúgubres?
Do cheiro doce saindo das pernas escancaradas?
Com raiva surda na mesma hora quis desligar o telefone e dizer que não mais a incendiava...Mas ele não acreditaria...Era tarde demais.Já conhece demais o corpo dela, e sabe como ele responde a seus toques sorrateiros.
Ela queria desligar o telefone.Mas ele continuava a dizer coisas com voz taciturna e arrastada:
- Quero você aqui agora comigo...venha...agora...Não vou fazer nada ...por que é você quem vai fazer.Pode fazer o que quiser...me bata, me cuspa, me prenda.Junte sua raiva toda e me machuque de uma vez por todas...me machuque como eu te machuquei...vou permitir uma unica vez.Aproveite e se vingue...Sua vida é curta ...A minha vida é curta.Vamos sangrar juntos.Vamos morrer juntos em cima de uma cama de motel barato.
-Não.
- Você é quem manda agora.Tenho saudade da sua brancura, das suas pernas me apertando com força impedindo de me mover...Tenho saudade do seu corpo molhado ...do seu sexo inundado pelo meu...Tenho saudade e você também tem...
-Não
- Cala a boca, não negue...eu sei que tem ...eu posso sentir você agora se remexendo na cama com a mão dentro da calcinha embriagada de desejo querendo me sentir agora.Querendo me colocar inteiro dentro de você.
-Não.
Cala a boca sua idiota.E pára de choramingar.Você é minha.Eu sou seu homem...Tenho certeza que quando eu desligar você vai arrancar a roupa toda e vai chamar pelo meu nome.Eu conheço você...Essa é sua decepção...Você nunca quis isso...Mas eu te domino com minha serpente.E sua tal inteligência deixa de ser no momento em que te golpeio fortemente com uma única parte do meu corpo.Pra mim de nada serve tua tal sensibilidade...Pra mim de nada serve tua tal inteligência...Pra mim de nada serve tua tal poesia.O que me serve em você é seu corpo quente, úmido e alvo...
-Não.
-Vai continuar a negar? Vai dizer que não esta embebida agora mesmo em suas próprias substâncias corpóreas?Vai negar que te viro as pupilas só com minha voz ao telefone ? Posso sentir agora minha mão no seu sexo e dele escorre suas negações.
-Não, eu não sinto nada.
-Sente...esta sentindo agora.Está me amando agora.Não consegue desligar o telefone?Sua voz me confessa agora.Está em desejo enquanto sua mãe na cozinha prepara o almoço, e seu pai fuma um cigarro na varanda.
-Eu...eu não quero...eu...
- Quer ...você me quer...como sempre me quis. E não venha com aquele velho assunto de mãos dadas a noite, almoços dominicais e declarações de amor ao pé do ouvido.Não é assim que você me quer...Nós sabemos disso , mas você nega pra sim mesma.Você não quer assumir que o que tem é tesão...é tesão somente.Inventou esta parafernália toda de sentimentos para se perdoar.Para perdoar o seu pecado maior que era o de não me amar.Você inventou o seu amor por mim .Ele não existe.O que existe é somente nossos corpos no ringue.Nossos corpos suando.Nossos corpos conversando.Nossos corpos lutando.Nossos corpos marcados pelos dentes de bocas esfomeadas.Isso é tudo.
- Não é verdade...eu...
- Vai continuar negando que apenas me ama quando puxo seus cabelos e mordo sua nuca tão forte que te marco por uma semana.Você chama isso de "demarcação de território" não é mesmo ? Com que crescentes delícias exibe suas marcas pra si mesma e diz pra si como uma gatinha no cio: Eu sou dele.Vai continuar negando que me ama no preciso instante em que deliras e diz : Sim amo...estou amando agora.
- Vou desligar...
- Você não vai desligar.Vai ficar e ouvir...Vem aqui me pedir porrada.Vem aqui me dar porrada...Se vingar de mim .Adoro você quando está com raiva.Adoro quando você me machuca com unhas e dentes.Adoro quando me aperta.Adoro quando arreganha sua boca para receber meu cálice...E deixa meu desejo descansar entre suas pernas...Adoro quando afasta com violência o meu rosto de suas partes íntimas...quando pede que eu a penetre forte e eu por pura maldade continuo a te inundar de saliva.Você implora, sacode o corpo , grita.Até chegar o momento que eu de fato te penetro e você fica serena e não me olha...não me encara.Não quer me ver...Quer apenas me sentir.
- Pára...por favor ...eu...
ARTE DE RAY CAESAR
- Não vou parar.Até que o seu cheiro de menina venha me visitar agora.Não sente saudade do meu negrume?Como foi mesmo que você certa vez me chamou em uma de suas poesias ? É...pele negra borbulhante não foi isso ? Sim , estou borbulhando agora mesmo querendo borbulhar dentro de você..Não quer arrancar os pelos brancos do meu peito com os dentes como você sempre fazia? Pode fazer o que quiser...você pode...você pode fazer o que quiser comigo agora , por que eu agora também estou refém de meu desejo querendo que você me salve...Você com suas unhas vermelhas, sua calcinha de algodão quase infantil, o seu corpo branco que fica lindo em cima do meu corpo negro.O contraste das cores que aparece no espelho do teto do motel...Vai dizer que não tem saudade disso meu amor?
-Não me chame de meu amor...pára de ser hipócrita.
- Mas eu te amo minha linda ...da mesma forma que você me ama : com o corpo ...e somente com o corpo.A unica coisa que de fato nos une é minha penetração em você...você sempre soube disso , mas quer inventar coisas só pra ficar mais romântico...Só pra ficar mais tragável nossa falta de pudor quando nos despíamos rápido em algum lugar qualquer em que você chorava de raiva por me ceder , mas que logo soltava aquele gritinho sem jeito.E eu bebia suas lágrimas...AH como você se deliciava ao mesmo tempo que queria me decapitar ali mesmo...Venha , eu deixo você me decapitar...Vem minha branca...vem ...to te esperando.
-Não , eu não vou ...
- Você vai vir...se não hoje algum outro dia...mas você não vive sem mim.Já te provei isso.
-Eu não quero...
-Você não quer ...mas vai vir...posso sentir isso desde já.E então quando virá?
Desligou o telefone.Despiu-se.Chorou.Tocou-se violentamente...
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