terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Posso?

Será que posso apenas ligar para ouvir sua voz neste momento? Vai ser insistência demais se eu quiser saber de tua vida agora? Será que é querer sofrer? Posso apenas lhe chamar pra almoçar e ver um filme que não seja romântico e que não force barra alguma?... Posso apenas dizer que lhe amo e que tua falta me garfa o peito e estraçalha a alma e inunda os olhos diariamente? Posso amor, posso? Posso ir até sua casa, para apenas sentir o cheiro do teu cigarro de canabis misturado ao suor das tuas roupas que vem do teu quarto trancado? Posso fazer aquele piquenique que nunca fizemos juntos, mas que sempre prometemos naquela floresta em que nunca dançamos nus em volta de uma fogueira? Posso amor, posso? Posso tatuar teu nome em alguma parte do corpo pra lhe mostrar que vai ser difícil apagá-lo da memoria, do corpo, da casa, das roupas, dos lábios, das fotos? Posso passar a noite no banco em frente a tua casa pra lhe mostrar que estou enlouquecendo e de repente fazer você ter medo de mim e me aceitar de volta por pena? Posso amor posso? Posso invadir teu quarto e arrancar tua roupa como num estupro? Posso pegar uma lâmina cortante e cortar meu corpo delicadamente pra lhe mostrar que sou maníaca depressiva? Posso raspar meu cabelo todo pra lhe mostrar que não tenho mais vaidade e que meu único homem é você? Posso fumar uma carteira inteira de cigarro initerruptamente pra adquirir um câncer de pulmão por você? Posso amor, posso? Posso escrever coisas tão doentias como essa em cartazes e colá-los nos postes das ruas que você passa? Posso comprar teu pão na padaria que você vai sempre comprar teu cigarro e fazer teu café da manhã em silêncio e assistir teu desjejum prazeroso? Posso fotografar aqueles teus olhos caídos e quase demoníacos e fundos e levá-los para um trabalho de amarração? Posso amor, posso? Posso me espalhar na tua cama enquanto você não volta da madrugada promissora de lapianas libidinosas e sem coração? Posso me esfregar no teu lençol e deixar minha marca nele pra que não te esqueças de mim assim tão facilmente? Posso amor, posso? Posso fazer aquele escândalo tão temido se eu te ver com outra e dizer que você é meu e demais ninguém, e chamá-la de puta, vagabunda, vadia? Posso amor, posso? Posso espalhar pra todo mundo que agora estou fazendo terapia e sendo medicada com ansiolíticos e antidepressivos por causa de você? Que estou tomando banhos com pétalas de rosas, mel e toda a parafernália em luas cheias, indicada por mães de santo de quinta categoria? Que tua foto ta embaixo de duas velas vermelhas com essência de oxum e que toda noite a esfrego no meu corpo com a esperança que anos de ateísmo não estraguem os feitiços pra te trazer de volta? Posso amor, posso? Posso perambular a esmo por todos os lugares que você frequenta e vender todos os meus textos e poesias que fiz pra celebrar tua vinda, e todas as palavras doentias que fiz pra me livrar da tua falta? Posso espalhar pra todas as mulheres do mundo que você não presta e que serão abandonadas a qualquer demonstração de ansiedade e carência delas? Posso rezar pra todos os santos, deuses, e inclusive pro seu Buda pra que broche todas as vezes que tente adentrar o corpo de qualquer lambisgóia libidinosa sedenta do seu corpo moreno com cheiro de macho híbrido? Quero é sangrar minhas dores todas no teu banheiro, e eu mesma chamar a ambulância, alegando que a vida é ruim sem você e que, por favor, não me salvem com soros. Só posso sobreviver com teu corpo, com tua alma do lado da minha, teus cachos colando no meu suor... é desse remédio que preciso. Vou gritar no hospital que não quero injeções, aparelhos de oxigênio, operações... vou pedir que não me façam sobreviver se você não voltar. Vou morder com dentes afiados qualquer enfermeiro ou médico que tentar me reanimar. Posso amor, posso?
Cena do Filme "Amores Imaginários" de Xavier Dolan