Ela se arrumou e se perfumou , para que ele se agradasse de sua presença.Agradou.
Terminaram como sempre com os corpos entrelaçados, suados , e gastos numa cama qualquer de motel esdrúxulo metropolitano.
Virou-se pro lado.
Ele lhe disse: - Vou me apaixonar.
Ela se surpreendeu.Aquele homem experiente que nunca sentiu falta de nenhuma mulher disse a ela que iria se apaixonar.E ela escutou.Porra!Ela escutou!
Tudo bem que ele não era nada daquilo que ela sonhou, não lia nada além que bulas de remédios, não conhecia The Strookes, nem Chet Backer, nem Mingus, nem Cat Power.De Chico Buarque conhecia apenas "A Banda", e achava que "AIDS" era uma "bactéria" (Pasme).Não ia ao cinema admirar as cores de Almodóvar, nem ao museu para se encantar com Chagall,mas droga era muito bom de cama pelo menos.O melhor até então.E sempre que a vida ficava escura , ia provar de suas substâncias antes que a noite se deitasse.Isso bastava pra ela , que era tão carcomida pelas decepções fugazes amorosas.E agora escutou um : -Vou me apaixonar...Você está mexendo com o meu coração.
Isso não era o que es esperava ouvir.Dele não.Nunca.
Claro que queria estabilidade emocional.Claro que queria um único homem a quem lhe presenteasse todo o seu desejo e sua falsa fidelidade.Claro que desejava alguem com quem pudesse ir pra cama todo dia , ou ao menos quase todo dia ...Ou ao menos toda semana.Sim ela era tambem esse tipo de "mulherzinha chata" que por vezes sonha em cozinhar para o marido que está por chegar.Que cuida dos filhos.Que se arrauma inteira apenas para um unico homem.Sim , ela desejava isso.Afinal as mulheres casadas pareciam tão felizes com suas luvas e aventais e mamadeiras.E ela ...coitada...sempre sozinha , migrando de amor em amor, de choro em choro.Queria sim ser de alguém , por mais que nunca aparentasse.
Ao ouvir isso, se surpreendeu e quis dizer coisa diferente do que disse : - Que bom!
Sim , "Que bom !" foi o que disse, e ela mesma não acreditou no que escutou de sua própria boca.Não era isso que queria?Um homem estúpido e bom de cama?Um homem previsível como aquele.A quem pudesse saber qualquer segredo, a quem pudesse descobrir qualquer defeito...Mas "Que bom !" foi o que disse.E ele não demonstrou nenhuma irritação.
Se vestiram.Foram embora.
Ela?Ficou pensando no que ele disse , e merda...sentiu saudade.Como se algo no coração (ou na cabeça , ou no sexo, ou no ...ah foda-se)tivesse sido despertado.
Ligou pra ele.
-Alô
- Alô Ramirez?Pode me ver?
-Claro, sempre.
- Vou ter aula até às 18 horas.
-Às 18 horas te busco então.
- Até lá.
- Um beijo.
Se encontraram.E de novo aquela leve impressão de tudo ser diferente minguou.Conversaram.Ele era tão incorreto.Era tão sem escrúpulos.Claro que ela também.Mas ele ...ah ele era...Não era pra ela droga.Mas ela continuou de pé.Ainda decidida a aturar por uma companhia cotidiana.
- Você quase morreu de prazer ontem ,disse ele, estava incrível.Nunca te vi daquele jeito.
-Que bom , disse ela dessa vez cansada de frases canalhas como aquela, e sem nenhuma frase melhor para dizer que a que acabara de dizer.
Suspirou.
Ele a olhou com desejo(da mesma forma que sempre olhava).
- Ramirez , você não é pra mim.
- Concordo.Acho que você deve procurar esse que te fez tao feliz, disse ele assim tão despreocupadamente, se referindo a um amor de seu passado.
- Mas e você?, perguntou para se certificar de sua insensibilidade romântica.
- Não nasci pra isso querida.
-Mas você ontem ...disse...
-Esqueça o que eu disse querida, me desculpe.
Saiu batendo a porta com violência , depois de o ter chamado de otário, babaca, covarde.Claro que não dariam certo, disso ela sabia bem.E claro que ela não o desejava assim tão veementemente.Mas foda-se, porra.Ele disse que estava apaixonado, e agora desdisse assim sem cerimônias, horas depois.
-Que babaca, pensou...Covarde.Como consegue ser tão inútil assim.Como consegue fazer do sexo essa coisa insípida.Como ele consegue fazer sexo como quem urina
Porra, por que não consigo fazer do sexo essa onda de prazer em que me banhar.Tem sempre algo antes , tem sempre algo depois.Sexo vem com uma multidão de sentimentos entrelaçados, os quais ele mastigou e vomitou logo após em cima de mim.Vomitou na minha boca,na minha coxa, nas minhas costas.Mas que famigerado vomitador de sentimentos.Odeio.Odeio.Odeio.Quero que morra.Quero que "broche" pra sempre...Idiota.Quero vomitar em cima dele , tudo o que vomitou em mim.Tudo o que vomitou em minha boca.Que nojo.E ainda me diz que quase morri de prazer...hahaha...Claro que não otário.Finji.Finji tudo pra te deixar feliz.E você agora me joga ese balde de agua fria.Imbecil.Como te odeio.
Pensava isso tudo tão intensamente, que não percebeu que seus pensamentos eram direcionados ao telefone dele, em forma de mensagens de texto.Triiiimm.O telefone tocou.Era ele.Atendeu.
-Alô
-Acho melhor você parar com isso, ta me deixando chateado.
-Vá se foder otário.
Desligou.
Chorou.Há tempos se sentia tão vazia.Andava procurando no sexo uma maneira de se distrair de seu vazio.Procurou em Ramirez, pois era a maneira mais fácil e prática de consegui-lo.Não que fosse feia, ou sem graça, e sim por que era um tanto imprópria para a sedução.Realmente não sabia fazer isso.Não gostava de festas , baladas, e dificilmente se atraía por um homem no mesmo dia que o conhecia.Era preciso mais que isso.Era preciso mais contato com sua essência.Era preciso conhecer seu espírito para que conseguisse sentir seu corpo arrepiar de desejo.
Mas não foi assim com ele.Nunca o achou interessante.Nunca.Aceitou um convite para sair , simplesmente por que achou diferente , um homem do dobro de sua idade e professor seu lhe convidar pra sair.
Se encontraram, e nunca , realmente nunca , se interessou pelos pensamentos e idéias de Ramirez.Mas Ramirez, por outro lado , era um leopardo negro para seduzir.E consegui arrancar suas roupas apenas com olhares lascivos.
Se esbaldavam.Era o que fazia sentido entre eles: se esbaldar.
Acabava sempre que aparecia alguem interessante em sua vida.E nao sentia a menor falta.Mas era so sua vida se infernizar, para voltar novamente àquele corpo como que à uma droga poderosa.Não se envergonhava.Afinal, era seu único homem.O único para quem se entregava e se nutria sempre.Como que num casamento.
Não percebia.Mas era fiel a ele, mas que a si mesma.
Um comentário:
As pessoas têm carência de cuidados.
Gostei de sua narrativa.
Abraço do Jefhcardoso do http://jefhcardoso.blogspot.com
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